Dr. Bruno Parentoni, advogado criminalista – Parentoni Advogados

Superior Tribunal de Justiça – STJ: Parâmetros para a busca pessoal e sua distinção para com a invasão domiciliar

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de habeas corpus e sob relatoria do Ministro Rogerio Schietti Cruz, delimitou, de maneira unânime, as premissas da busca pessoal prevista no artigo 244 do Código de Processo Penal, bem como realizou importante distinção em relação à invasão domiciliar (busca sem mandado).

Trata-se de mais um importante precedente, decidido em sede de Habeas Corpus, que define os parâmetros de elemento de prova. Dessa vez em julgamento pelo órgão máximo de direito criminal da Corte da Cidadania.

O Ministro relator ressalta que a Sexta Turma do STJ já havia interpretado o referido dispositivo legal, inclusive estabelecendo critérios para a realização da busca pessoal: RHC n. 158.580/BA, Rel. Ministro Rogerio Schietti, 6ª T., DJe 25/4/2022.

E pontua que seguiu-se a esse julgamento uma profusão de decisões sobre o tema neste Superior Tribunal, nas quais, gradativamente, caso a caso, o conceito de fundada suspeita de posse de corpo de delito foi sendo concretizado em diversos contextos.

Enquanto em alguns desses contextos a posição da Seção já se consolidou razoavelmente – como, por exemplo, a insuficiência de menções genéricas a “atitude suspeita” ou ao “nervosismo” do acusado para justificar uma busca pessoal –, em outras situações ainda oscila a compreensão do colegiado quanto ao preenchimento (ou não) dos requisitos legais para a medida.

Nesse julgado, o relator buscou enfrentar se a repentina fuga de um individuo ao avistar uma guarnição policial é suficiente, ou não, para justificar a busca pessoal.

Ressaltou a dissonância de entendimento da matéria entre ministros das duas turmas e enfrentou minuciosamente a questão, formando uma compreensão consolidada da Corte sobre ela.

Segue um resumo do voto do Ministro Relator:

·        as buscas pessoais previstas no art. 244 do CPP têm natureza processual penal e são distintas das buscas realizadas na entrada de estabelecimentos fechados e na área de embarque de aeroportos, cuja natureza é contratual;

·        as blitze e abordagens de condutores no trânsito objetivam a fiscalização das normas de trânsito, com amparo no poder de polícia administrativa previsto especialmente nos arts. 19 a 25-A do CTB, e são diferentes das buscas veiculares destinadas à procura de drogas e armas, de natureza processual penal e fundamento no art. 244 do CPP;

·        buscas pessoais causam constrangimento mesmo se feitas sem violência abusiva e o próprio protocolo operacional padrão das polícias para realizá-las, embora se justifique para preservar a segurança do policial contra eventual reação, é atemorizante;

·        a fundada suspeita de posse de corpo de delito deve ser sempre prévia à busca, e a avaliação retrospectiva dessa suspeita, depois de conhecido o resultado da diligência, pode ser influenciada por um viés cognitivo conhecido por “viés retrospectivo”;

·        não se despreza completamente a experiência dos policiais, mas medidas invasivas em um Estado Democrático de Direito não podem ser baseadas em meras intuições ou impressões subjetivas, assim como juízes experientes, mesmo que eventualmente possam “sentir” que o réu mentiu em seu interrogatório, devem sempre fundamentar objetivamente qualquer decisão contra ele com base em elementos concretos;

·        há uma diferença jurídica de tratamento entre as buscas domiciliares e as buscas pessoais, o que justifica a adoção de um standard probatório um pouco menos rigoroso para as buscas pessoais. Por isso, embora esta Corte tenha o entendimento de que fugir correndo repentinamente ao avistar uma guarnição policial, por si só, não justifica o ingresso em domicílio, essa atitude autoriza uma busca pessoal em via pública;

·        A prova do motivo da busca, cujo ônus é do Estado, por ser usualmente amparada apenas na palavra dos policiais e estar sujeita a risco de alterações discursivas voltadas a legitimar a diligência, deve ser submetida a especial escrutínio, o que implica rechaçar narrativas inverossímeis, incoerentes ou infirmadas por outros elementos dos autos.

HC N. 877.943, MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ, DJE DE 19/12/2023

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Bruno Parentoni

Bruno Parentoni

Advogado criminalista, sócio do escritório Parentoni Advogados. Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, pós-graduado pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Portugal, especialista em Direito Processual Penal e Penal Econômico, atuante nos Tribunais Superiores. Membro do IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.