Dr. Roberto Parentoni, advogado criminalista

Essa história ocorreu no início da minha carreira, em 1991, e até hoje, como advogado criminalista, me recordo com um misto de incredulidade e aprendizado. O caso, que inicialmente parecia ser apenas mais uma audiência comum no tribunal, rapidamente se tornou um marco inesquecível sobre a importância dos detalhes na defesa de acusados e o impacto de um erro no reconhecimento de testemunha.

A Defesa de Três Réus

Eu estava acompanhado de dois colegas — um advogado e uma advogada — e defendíamos, individualmente, três réus acusados de roubo e sequestro em um sítio. O caso, que a princípio parecia simples, se arrastava desde as primeiras horas da tarde, pois estávamos aguardando a chegada das testemunhas, da vítima e, especialmente, dos réus, que estavam presos em outra localidade. Já passava das 19h, e a chuva incessante batia contra as janelas do fórum, criando uma atmosfera de cansaço coletivo na sala de audiências.

O ambiente estava tenso. Todos já estavam exaustos, com os olhares pesados e as costas doendo de tanto tempo sentados. E então, chegou o momento crucial: o depoimento do caseiro, que, além de ser a vítima do crime, seria responsável pelo reconhecimento do réu.

O Erro de Reconhecimento do Réu

O juiz, com seu semblante sério, fez a pergunta mais aguardada: “Você reconhece os réus presentes aqui?” O caseiro, visivelmente exausto e com os olhos cansados, olhou para os lados, virou o pescoço e fez uma rápida inspeção, como se estivesse procurando algo ou alguém. Após um tenso silêncio, apontou para… a nossa colega advogada, e disse: “É ele!”

Sim, a advogada que estava sentada ao lado dos réus. O caso, que até então parecia seguir seu curso, foi marcado por um erro bizarro de reconhecimento do réu. Naquele momento, todos na sala ficaram em estado de choque. Eu e o advogado ao meu lado nos entreolhamos, sem saber se aquilo era real ou se havia ocorrido algum engano no tribunal.

A Reação Inusitada da Advogada

O mais surpreendente foi a reação da nossa colega advogada, que, visivelmente irritada e desconcertada, respondeu ao caseiro em alto tom: “Você está louco ou é míope?”. A sala explodiu em um murmúrio de incredulidade. O juiz, tentando manter o controle, interrompeu imediatamente a audiência, afirmando que todos estavam exaustos, e decidiu remarcar o julgamento para o dia seguinte.

Lições Importantes para a Defesa Criminal

O erro grotesco no reconhecimento do réu não foi apenas um deslize, mas um exemplo claro da importância de uma defesa atenta e da necessidade de questionar cada detalhe. O caseiro, em nenhum momento, reconheceu corretamente os réus, e eu sabia que isso precisava ser registrado em ata, mesmo que meu cliente não estivesse entre os apontados.

Esse episódio me ensinou que, em uma audiência criminal, cada detalhe importa. Qualquer falha no reconhecimento deve ser minuciosamente documentada, pois cada passo na defesa de um cliente é uma busca pela verdade.

Aquela audiência me fez perceber que a defesa criminal vai muito além de argumentar e apresentar provas. É sobre estar atento ao inesperado, ao que muitos deixam passar, e entender que, às vezes, é o olhar afiado sobre os menores detalhes que pode mudar o rumo de um julgamento.

Fraterno abraço,
Roberto Parentoni

 

Roberto Parentoni

Roberto Parentoni

Dr. Roberto Parentoni é advogado criminalista desde 1991 e fundador do escritório Parentoni Advogados. Pós-graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, é especialista em Direito Criminal e Processual Penal, com atuação destacada na justiça estadual, federal e nos Tribunais Superiores (STJ e STF). Ex-presidente do Instituto Brasileiro do Direito de Defesa (IBRADD) por duas gestões consecutivas, é também professor, autor de livros jurídicos e palestrante, participando de eventos e conferências em todo o Brasil.